Casos de utilização de Skate Parks como ferramenta de reurbanização e melhoria das condições urbanas

Este é o resultado de uma das pesquisas realizadas para o Projeto Pás na Ucrânia, que estuda formas de resgatar a antiga pista da Praça da Ucrânia, em Curitiba – PR. Parte ou a íntegra deste texto estará no documento que orienta o projeto.

Conheça o Projeto Pás na Ucrânia

Copenhague: a cidade das pontes. Porque estão permitindo pistas ‘clandestinas’

Em matéria vinculada no “The Guardian” em 19 de dezembro de 2016, o autor escreve sobre como houve uma mudança na percepção da prefeitura quanto às ditas “pistas de skate clandestinas”, onde skatistas da cidade ocuparam terrenos em áreas abandonadas e construíram suas próprias pistas com restos de concreto e com organização independente dos próprios skatistas, que colocavam a mão na massa.

Inicialmente a prefeitura era contra, mas ao observar mais de perto os resultados, passaram a apoiar as iniciativas, principalmente nas áreas negligenciadas da cidade e em regiões de prédios abandonados. Estas áreas passaram a ser vistas como áreas mais ativas, vivas e mais seguras.

Um dos conselheiros da prefeitura de Copenhague envolvidos nesta visão mais moderna e progressista de desenvolvimento urbano disse “Você quer que as pessoas sejam ativas e se envolvam com sua cidade”, diz Strange. “Mesmo que as pessoas estejam mudando o espaço público para seus próprios propósitos, elas o fazem com amor e energia positiva porque querem criar algo.”. Esta visão levou mesmo até a estratégia conhecida como Fælleskab København (Co-criação de Copenhagen). Sua visão é desenvolver a capital em colaboração com quem a usa – moradores e turistas – para transformá-la em uma “cidade viva … uma cidade com fronteiras”.

Na prática, a administração passou a ouvir as pessoas que ocupam a cidade e, ao invés de fechar os olhos para as modificações de hábitos e formas de utiliza-la, passaram a construir juntos um lugar em que todos se sentissem em casa.

Figura 1 Hullet (the Hole) is set to be destroyed to make way for luxury apartments. Photograph: James Clasper
Figura 2 Pista “DIY” na Portland’s Burnside Bridge

Fonte: https://amp.theguardian.com/cities/2016/dec/19/city-with-edge-copenhagen-illegal-skateparks

Kickflips & Curb Cuts: novos parques de skate moldando o design urbano

Em artigo de  Eric Baldwin para o site de arquitetura “mais visitado do mundo”, segundo o próprio site, ele relembra que por mais controle que um arquiteto tente ter sobre seus projetos urbanos é praticamente impossível prever de que forma o equipamento será utilizado. A prática de skate é uma destas formas, que conversa o tempo todo com a arquitetura urbana e reinventa seu uso.

Diversos estudos em arquitetura tratam do assunto, como o manual citado pelo autor chamado “A Skateboarder’s Guide to Architecture” (http://loudpapermag.com/articles/a-skateboarders-guide-to-architecture-or-an-architects-guide-to-skateboarding?utm_medium=website&utm_source=archdaily.com), que basicamente ensina a adaptar as cidades modernas ao novos modos de ocupação do espaço urbano e de áreas antes abandonadas.

Neste sentido, no artigo, o autor ainda reúne diversos exemplos de pistas de skate projetadas para estarem em meio ao ambiente urbano, como exemplificado nas fotos publicadas no texto, reproduzidas abaixo.

Figura 3 Skate Park Jardines de Aureà Cuadrado / SCOB
Figura 4 Skaterhall / Herrmann + Bosch Architekten –  Stuttgart
Figura 5 Navarcles SKATEPLAZA / PMAM + Skate Architects
Figura 6 A Skate-spot near the Krymsky overpass / Snøhetta + Strelka KB + Strelka Architects
Figura 7 Skate Park Nou Barris / SCOB
Figura 8 StreetDome / CEBRA + Glifberg + Lykke

Fonte: https://www.archdaily.com/946371/kickflips-and-curb-cuts-new-skate-parks-shaping-urban-design

West LA Courthouse skate plaza

Este importante local em Los Ângeles é um dos mais conhecidos no mundo por diversas aparições em filmes de skate. Sua história peculiar mostra como um olhar atento para as práticas da população, aliada à organização da comunidade e de empresas do ramo podem transformar a cidade. Por muito tempo este “spot” foi encarado como um local proibido à prática de skate, mas por sua reconhecida importância, a empresa Nike, aliada aos moradores skatistas locais, conseguiram durante uma campanha no evento “Go Skate Day” de 2014 os recursos e a voz necessários para que a prefeitura apoiasse a transformação do espaço em uma pista de skate “oficial”.

Figura 9 West LA Courthouse skate plaza – Pinteres: Os 25 lugares para skate mais icônicos de todos os tempos
Figura 10 Revistalização do “West LA Courthose” para o Go Skateboarding Day 2015 (https://skatekrak.com/mag/go-skateboarding-day-2015-west-los-angeles-courthouse)

Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/West_LA_Courthouse_skate_plaza

Necessidade da participação do município nas dinâmicas reais da cidade

Em outra reportagem, esta brasileira, da Folha de São Paulo, temos um exemplo de uma das experiências nacionais de espaços revitalizados pela presença de skate. Em visita à uma pista “feita pelos próprios skatistas”, com as características já  mais próximas à própria realidade brasileira, mais especificamente de subúrbio paulistano, mesmo com ambiente de violência e agressividade que cerca a comunidade, a pista de skate criada pelos próprios skatistas tornou-se um refúgio à esta “contaminação”.

A reportagem reforça ainda como o skate está presente nos hábitos da população e como espaços dedicados à prática criam as condições para seu crescimento. Em citação do artigo lembra-se que os resultados olímpicos são reconhecidamente consequência de uma cultura existente e viva.

Ainda, após visitas a diversas pistas em São Paulo, verificou-se que a organização destes espaços se faz necessária, até com relação às regras sanitárias relacionadas à pandemia, o que faz ainda mais importante um olhar do município no sentido de apoiar e participar da dinâmica das cidades.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/esporte/2021/08/skate-em-sao-paulo-ocupa-pracas-e-pistas-viram-refugio-contra-o-preconceito.shtml

Barcelona e Brasília

Menciono ainda dois outros exemplos, mas de forma rápida, pois cada um deles renderia mais outros novos artigos.

No caso de Barcelona, uma das cidades mais importante no cenário do skate mundial principalmente na questão da cultura do skate e uso do equipamento urbano, encontramos uma cidade totalmente amistosa à prática do skate em ruas e praças, mesmo não sendo locais pré-definidos para este uso. Mas trata-se muito mais que uma mera permissão para o uso, mas uma cultura de uma cidade toda que valoriza o uso da cidade e dos espaços públicos pela população. Há de fato o hábito da população de ocupar os espaços públicos. Indico ouvir a conversa muito legal onde o Rafael Petersen “Charlie B”, curitibano que vive em Barcelona já há muitos anos, conta um pouco da cultura que encontrou lá e até como acabou virando cartão postal da cidade com uma foto sua andando de skate em frente ao MACBA.

Entrevista Rafael Petersen Charlie B (Youtube)

Já a cidade de Brasília ganhou recentemente uma praça que chamou muita atenção por suas características “skatáveis”. De fato, o projeto não era de uma “pista de skate”, muito embora cada detalhe tenha sido pensado de forma a proporcionar um local perfeito para receber a comunidade do skate. Em matéria com textos e fotos publicada pela Revista 100% pode-se verificar os detalhes do lugar. Veja no link abaixo onde fica a localização desta “skate plaza”.

Localização da Praça do Povo no Guia de Picos de Skate MyTrix

Conclusão

No importante “TED” de título “Vamos tratar a violência como uma doença contagiosa” apresentado pelo Dr. Gary Slutkin, o experiente médico que trabalhou no combate ao HIV, tuberculose e outras epidemias na África nos conta como ele aplicou os métodos de controle de doenças ao problema da violência urbana observados em algumas das maiores cidades dos EUA. Trata-se de entender a violência urbana como algo que se propaga como uma epidemia. Tanto que, durante a palestra, Gary demonstra com números impressionantes o sucesso das ações nas cidades onde o método foi aplicado. E os resultados extraordinários foram alcançados não com repressão ou afastamento dos cidadãos da administração pública, mas ao contrário, identificando o “foco da doença” e elegendo pessoas das próprias comunidades para serem agentes de fomento aos objetivos.

Citamos aqui esta ação descrita por Gary para exemplificar que o clima de paz, senso de comunidade, zelo pelo patrimônio urbano e orgulho de fazer parte de uma cidade deve vir da ciência envolvida em aproximar a administração pública dos cidadãos até que este limite nem mais seja percebido. E as ações passam por entender a ocupação da cidade, em ouvir e negociar os termos de uso da cidade, e em promover o respeito mútuo entre prefeitura e moradores.

A ação de restauração da Pista de Skate da Ucrânia envolve todos estes fatores e pode gerar uma construção rica que envolverá a comunidade como um todo e aproximará a população da administração pública.

Agradecimentos ao Rafael Fernando da Silva (@rafaelsino) que indicou vários artigos e sites para consultas e à todos os envolvidos com o projeto da Pista da Ucrânia.

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Ricardo GosWod “Fuça”


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